Apontamentos do Jurí

O Mendigo – Durval Cunha

Cia. 7 em Cena


Apontamentos
O Mendingo de Duval Cunha, encenado pela Cia. 7 em Cena, opta pela simplicidade e jogo em cena com os atores Edson Alcântara e Laura Modepp. A trama inicia-se quando Carmem (Laura), uma perua de classe média depara-se com seu ex-marido Jonas, travestido como um mendigo; Porém a mesma não se impressiona com a condição do ex e lhe cobra dividas atrasadas do divórcio, iniciando uma negociação tragicômica com o “pobre”homem.

Fica claro que a direção trabalhou e investiu no jogo cênico e na preparação dos atores, que mostram uma atuação segura, regendo momentos de triangulação, tempo de risos e pausas, sobretudo Laura, que apesar de pouco tempo de palco, surpreende por apresentar uma atuação limpa de excessos e trejeitos afetados na mascara facial, muito comum entre os iniciantes, dando suporte para seu companheiro de cena que também mostra-se a vontade na trama.

O Mendingo é um espetáculo verborrágico e faz da palavra elemento principal no desenvolvimento da trama; primando pelo diálogo entre os atores, que por sua vez jogam o subtexto ao público, que a todo instante se vê cúmplice e se compadece da situação de Jonas. Entretanto, visto que o ritmo do espetáculo apresenta-se bem pontuado, valeria a pena que a direção investisse em outras conquistas como, recursos de sonoplastia, sobretudo na apresentação de Jonas, que no inicio esboça uma entrada clownesca na atmosfera urbana de uma cidade, porém em alguns momentos perde sua força. Além da personagem Carmem, que em outros momentos ilustra satirizando a situação de Jonas.

A cenografia e luz propõe um preenchimento do palco de forma equilibrada e muito criativa, o que faz do espetáculo um deleite cênico.

Ricardo Verissimo
DRT - 32819 - ator, jornalista e produtor
Jurado do VI Festeatro – Mostra Meia Paris de Teatro Estudantil



Bem Me Quer, Mal Me Quer – Priscila Modanesi
Teatral Educando com Arte

Bem Me Quer, Mal Me Quer de Priscila Modanesi, nos mostra um triangulo amoroso entre Inácia, Pedro e Liliane, numa disputa que perfila o ciúmes doentio e o jogo de poder e sedução proposto pelas personagens, com a entra de Pedro, um elemento surpresa que evenena e induz ao lado passional de Inácia, que vê em Pedro uma oportunidade de mostrar sua alma corrompida pelo ódio e desejo de vingança.
O espetáculo insere-se na linguagem do teatro-dança, propondo de forma orquestrada diálogos em dança, em que vemos explicitamente as intenções e subtextos das personagens em constante conflitos. Fruto de pesquisas entre mestres como Pina Bausch, Stanislavski, Eugênio Barba e Rudolf Laban, a encenação da Cia. Teatral Educando com Arte, lança a seguinte questão ao olhar do público. O quanto de dança pode ser falado e o quê de texto pode ser dançado?
É neste questionamento a teia entre as personagens é tecida ora tênue ora confusa. Ainda há muito peso e ruídos em algumas movimentações dos atores. É preciso mais leveza, o tônus ainda confunde-se com peso. Assim como a sobreposição de cenas, que apesar de interessante ainda necessita de ajustes e pontuações, para que nada escape ao olhar e entendimento do público.
Quanto às atuações, Leonardo Rodrigues no papel de Felipe, trabalha magistralmente a ambiguidade que sua personagem propõe, assim como Tábata Grisotto, que apresenta uma evolução como Inácia, no papel de namorada traída com sede de vingança, assim como Alexandre Carvalho, “Pedro”, que fica dividido entre o desejo e o amor por Inácia. Já Priscila Modanesi, como Liliane tem forte presença cênica, entretanto, pode investir e explicitar mais o elemento sedução como carga para sua personagem.
Bem Me Quer, Mau Me Quer, ousa em na proposta cênica e apresenta um trabalho que converge linguagens, conquistando de lançando o público a partilhar do desassossego das personagens, assim como sua composição de rosas, vinhos e folhas secas que transmutam a poesia e magnetismo do espetáculo.


Ricardo Verissimo
DRT - 32819 - ator, jornalista e produtor
Jurado do VI Festeatro – Mostra Meia Paris de Teatro Estudantil



A Colcha Mórbida de Berenice – Adaptação de contos de Edgar Allan Poe
Cia. Teatral Tapanacara Mutatis Mutandis


A Colcha Mórbida de Berenice apresentado pela Cia. Teatral Tapanacara Mutatis Mutandis, de Itapetininga, traz uma adaptação dos contos  Os Dentes de Berenice, O Gato Preto e O Corvo de Edgar Allan Poe. Porém ainda ofusca o clima sombrio proposto pelo espetáculo com atuações ainda inseguras e com diferentes contrates.
A encenação conta a história de Egeu que tem uma doença chama “Monomania”, uma fixação pelos seus fascínios, dentre eles os dentes de sua prima Berenice. Entretanto, o que deveria ser evidenciado some no pano de fundo da história.
Logo na entrada, a primeira imagem que o público vê é uma sala mórbida, com “cadáveres” compondo um quadro, numa espécie de caixa preta com uma imensa tela de tule negro. Uma imagem interessante, porém que não se sustenta na evolução do espetáculo. Como apontamentos que possam servir ao grupo, valeria a pena um trabalho de preparo e jogo entre os atores, buscando evidenciar as intenções de cada personagem dentro da história, com por exemplo a protagonista, Berenice, que poderia ter o elemento sedução e inocência melhores desenhados, mas que apresenta-se apática, sem nuances na atuação de Carolina Haubt.
Vale destacar que de uma forma geral as situações no decorrer da trama, ainda passam de forma muito rápidas. Não há exploração de pausas e momentos dramáticos ou até mesmo mórbidos. Salvo as aparições de Clara Maria, no papel de “Mãe”, com objetivo de atormentar seu filho Egeu. Neste sentido, a direção pode orquestrar melhor os momentos e acontecimentos dentro da trama, assim como investir mais num aprofundamento e relações entre as personagens, buscando explorar sensações e o subtexto que é visto ou seria para ser visto pelo público.


Ricardo Verissimo
DRT - 32819 - ator, jornalista e produtor
Jurado do VI Festeatro – Mostra Meia Paris de Teatro Estudantil





Hitletr – A História Que Ninguém Contou
Cia. Teatral 4 Cantos de Quadra de São Paulo


Apontamentos


Hitletr – A História Que Ninguém Contou, da Cia. Teatral 4 Cantos de Quadra - SP nos apresenta um recorte sobre a adolescência e juventude de Adolf Hitler, talvez um dos maiores ditadores da humanidade que em 1921 tornou-se líder dos nazistas e a partir daí desencadeou várias ações, perseguindo grupos minoritários considerados indesejados - tais como, Testemunhas de Jeová, eslavos, poloneses, ciganos, homossexuais, deficinetes físicos e mentais e judeus - no que se tornou conhecido como Holocausto.
Entretanto, a encenação da 4 Cantos não toma esse viés e ao contrário de cenas e trejeitos já esperados numa história sobre o ditador, apresenta uma trama de amor permeada por conflitos de ideologias e torturas, buscando em alguns momentos um sadismo que ainda apresenta-se timidamente. O grupo também opta pelo elemento "corda", que referencia o jogo de poder entre as personagens, ligando seus corpos e propondo movimentos bem interessantes. Ao meu ver, esses movimentos podem ser ampliados na busca de uma organicidade, deixando essa corda mais moldada aos corpos dos atores, mais tênue, como um jogo de “enredamentos”, onde as personagens podem desenhar mais suas sensações a cada gesto.
Entre seis atrizes que revezam-se no papel de Rosa, há uma concentração louvável, porém, encontra-se uma apatia entre o elenco na apresentação da personagem, ainda sem muita emoção e uma tonalidade deficiente em falas que deveriam permear a sedução, indignação e a contradição. É preciso um trabalho que busque evidenciar mais suas intenções, que ainda se perdem um atuações muito lineares. Vale destacar que as atrizes Victória Leone e Vânia Antunes arriscam mais nesse viés e conseguem transpor um pouco a barreira da linearidade.
Talvez, como exercício cênico seria interessante o revezamento de atrizes entre os quadros apresentados, afim de encontrar volumes diferenciados para a evolução da personagem, que começa adolescente e termina uma mulher adulta e indignada com a posição de seu grande amor, Hitler.
Hitler, interpretado por Benemari Sulivan constrói uma trajetória de mudanças ao longo do espetáculo, mas ainda precisa verticalizar mais os conflitos com Rosa, deixando transparecer seu lado dúbio entre o amor e a dominação que o cerca, entre o homem e o líder-ditador.
A Cia de uma forma geral cumpre seu papel na realização do espetáculo, porém pode desenvolver mais seu potencial cênico, buscando mais triangulação com o público, exploração vocal entre os diálogos do casal, pausas e organicidade com os corpos entrelaçados nas cordas. Cabe ao grupo e a direção refletir e levar o espetáculo novamente a sala de ensaio, a fim de exercitar experimentações que podem fomentar mais ainda o belo trabalho já conquistado.




Ricardo Verissimo
DRT - 32819 - ator, jornalista e produtor
Jurado do VI Festeatro – Mostra Meia Paris de Teatro Estudantil

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